'Gari influencer' de Feira de Santana realiza sonho de dirigir carro da coleta

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'Gari influencer' de Feira de Santana realiza sonho de dirigir carro da coleta

Ele diz que vai continuar na limpeza pública por opção 

Crédito: Divulgação
É notória e até tradicional a desvalorização e o preconceito sofrido por aqueles que desempenham atividades laborais que são socialmente consideradas de baixo prestígio. O senso comum resume as baixas expectativas, falta de outras oportunidades como principal motivação que levam os agentes de limpeza pública a escolherem tal profissão. Entretanto, a estabilidade do cargo público e até mesmo a vocação, faz parte considerável da categoria não querer mudar de emprego, apesar das dificuldades encontradas, principalmente, por causa do estigma social.

Exemplo disso é o caso do servidor Josemário Silva, 29 anos, que se tornou agente de limpeza pública para realizar o sonho de se tornar motorista do carro da coleta. O gari conseguiu realizar o sonho e conta como foi todo processo. "Comecei a dirigir o caminhão da coleta, no último dia 4 de novembro. O processo foi um pouco longo, esperei mais de 3 anos para conseguir, me capacitei ao máximo, aguardando uma oportunidade de ser motorista da coleta de lixo. Finalmente a empresa fez um recrutamento interno, onde 6 agentes de limpeza participaram e três passaram na seleção. A etapa final foi um prova com 18 questões sobre direção defensiva, onde o melhor colocado receberia a vaga", conta.

Josemário diz que já sonhava com o cargo e que já entrou na empresa com a meta de ser motorista do caminhão. Sonho que foi inspirado pela atividade do pai. "Meu pai era taxista e trabalhava rodando e eu também queria trabalhar dirigindo, mas sempre pensei em carro grande como caminhão. Então corri atrás, foi um pouco doloroso o processo, mas costumo dizer que só quem suporta o processo, vive o propósito. E hoje, graças a Deus, estou como motorista da empresa Sustentare", narra.

A história do agente se espalhou e proporcionou o surgimento de uma outra carreira que, inclusive, é almejada/prestigiada por muita gente atualmente, a de influenciador digital. Contudo, ele não se mostra muito atraído pela possibilidade de enveredar pelos caminhos de celebridade digital e se faz bastante seletivo para aceitar trabalhos. "Eu consigo contratos publicitários como influenciador, faço divulgações de lojas e de marcas. Porém, eu utilizo as minhas redes mais para fazer a conscientização sobre perigos que coletores ou agente de varrição passam no dia a dia. Uma vez eu conversei com um digital influencer e ele me disse 'Mano, vocês está na contramão, porque hoje tudo é voltado para o lado do humor e você falando de conscientização'. Eu falei para ele que é isso aí que destaca o meu trabalho, porque poucos fazem. Mas, sempre que aparece uma oportunidade boa, eu pego. Até para ajudar nas despesas, mas não é tudo que eu aceito".

Mesmo com ressalvas, Silva, conta que tem um bom engajamento. Diz que as pessoas curtem seus vídeos, compartilham, interagem e considera os seguidores como se fosse uma grande família. "É como se todos fossem meus amigos. Outro dia minha sobrinha perguntou se eu não tinha um grupo reservado de melhores amigos (close friends), para postar nos stories (recurso do Instagram) e eu disse que não, pois todas as pessoas que estão ali são como amigos e eu não separo ninguém. Sempre que eu posso eu respondo todo mundo e quando eu demoro a postar, eles me perguntam porque que sumi. Sempre me incentivam".

Preconceito

O jovem motorista salienta que teve diversas experiências ruins, inclusive, a que sofreu há pouco tempo numa abordagem policial e conta com exclusividade ao Jornal Folha do Estado. "Eu estava saindo do trabalho, todo uniformizado, com crachá contendo número de matrícula. O preconceito é que estava em um carro que, para eles, era muito bom (de porte). Pelo fato de ser gari, estava ali fardado dirigindo um carro, o policial deduziu que meu carro era roubado. Disse que eu era traficante, que eu estava usando o cargo de fachada. Eu tenho 29 anos, nunca tive passagem na Polícia, fiz o consórcio do carro de 6 anos e estou com o veículo há três. Muito chato! Estou falando disso em primeira mão, vários veículos me solicitaram, pois o vídeo circulou nos sites de notícias e muita gente viu, mas eu não quis falar. A pessoa dá um duro danado, conquista as coisas através do seu trabalho e do seu suor e passa por esse constrangimento. Mas, é isso aí, agora é bola para frente", lamenta.

O episódio da abordagem policial não foi fato isolado, o servidor público diz ainda que o preconceito faz parte do dia a dia da função. "Quando eu trabalhava de gari, também sofri muito preconceito, as pessoas passavam por mim, eu falava e elas não respondiam, viravam o rosto, mas quando eu estava sem farda elas falavam. Às vezes estava limpando com carrinho do lixo e pessoas jogavam sujeira no chão, mas não jogavam no carrinho".

O 'coletor influencer' diz buscar na família o seu alicerce emocional para continuar realizando seus sonhos. Além disso, ressalta que gosta de atuar na limpeza pública por ser uma nobre missão. "A família é a base, nosso pilar. Graças a Deus eles me apoiam sempre. Entendem que é o que gosto, desejo continuar na área da limpeza pública, ou seja, vou continuar contribuindo para a limpeza de nossa cidade. Além disso, tem a questão também da melhoria de salário, pois praticamente o salário de um gari para um motorista, dobra o valor. Isso traz uma estabilidade financeira e um pouquinho mais de conforto para nossa família, acabar a reforma de minha casa, por exemplo que já tem um tempinho que estou nessa luta", argumenta.
 

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Sábado, 04 Mai 2024

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