Mães negras enfrentam desafio diário de criar filhos empoderados
Esse é o tema da terceira matéria especial do novembro negro
Para além dos desafios enfrentados pelos pais para criar os filhos, os pais de crianças negras ainda precisam saber lidar com situações impostas pelo racismo estrutural e institucional que, diariamente, atingem essa parcela da população e, consequentemente, refletem no desenvolvimento e na saúde mental dessas crianças. Esse é o tema da terceira matéria especial do novembro negro.
Se para muitos pais não negros a dificuldade está, por exemplo, em explicar por qual motivo não pode comprar determinado brinquedo, para os pais negros a questão, entre outras inerentes às curiosidades próprias da idade, está em fazê-lo entender que, pelo simples fato de ter nascido negro, encontrará diversas barreiras pelo caminho.
E é driblando as adversidades com base no passado, mas com o olhar voltado no futuro que a técnica de enfermagem Elane Nascimento, 39 anos, educa o filho João Victor, de 10 anos. "Realmente não é fácil, porque não basta ensinar a não ser racista, é preciso ensinar a ter atitudes antirracista, é lutar contra o sistema, e dar a ele embasamento sólido para argumentar e reconhecer alguns discursos racistas camuflados e combater. A estratégia aqui em casa é baseada em conhecimento e diálogo. Conhecimento da história de luta do nosso povo negro para que chegássemos até aqui impondo respeito, lutando para ter voz e vez porque a luta é contínua e estamos muito longe de uma sociedade igualitária. Os diálogos são constantes porque ele sempre traz questões onde coloco ele para pensar e chegar às suas próprias conclusões", explica ela.
Elane conta que, embora a teoria seja muito importante para o desenvolvimento e conscientização do filho, ela precisa estar sempre alinhada às práticas, ratificando as vivências de cada membro envolvido neste processo de desconstrução e reconstrução.
"Acredito no exemplo para tudo na vida. Não adianta eu exaltar o cabelo dele enquanto aliso o meu. Nada contra quem alisa, acho que somos livres para sermos o que quisermos ser e como nos sentirmos bem. Ele sempre me viu cuidando do meu crespo com verdadeira paixão, sempre falei o quanto nós, negros, somos lindos, nossos traços são marcantes e isso foi tão natural, tão verdadeiro que nunca existiu nenhum questionamento contrário. Ele sempre se olha no espelho e fala: 'cara, tu é lindo, viu!'' Eu acho tão lindo a forma que ele se vê, acho que estou no caminho certo em relação a educação dele", conclui a mãe, orgulhosa.
Com certeza, Elane pode se orgulhar da forma como vem educando João Victor, pois os reflexos dessa educação já são visíveis no empoderamento e na autoestima do pequeno. "Eu me olho no espelho e me reconheço, sinto orgulho e me acho lindo. Gosto de meu cabelo black, porque é assim que eu sou de verdade", declara João. A autônoma Leila Carvalho, 38, conta que, apesar da filha ter apenas 2 anos e três meses, e ainda não compreender os processos discriminatórios que recaem sobre o povo negro, desde sempre tenta mostrar a ela a importância da auto aceitação e valorização.
"Falo sempre que ela é linda, que ela é uma princesa. Ela é muito linda. Espero para o futuro dela que este mundo seja menos preconceituoso, que ela nunca passe pelas coisas que eu já passei e passo. Um negro entra no mercado, em uma loja, e os seguranças só ficam atrás. Então, não quero que ela passe por isto", desabafou a mãe da pequena Layanne.
"A maior dificuldade é não deixar que ela seja contaminada com todas as informações racistas que são veiculadas diariamente pela mídia convencional. Minha principal estratégia é enfatizar a beleza que é inerente ao povo negro e procuro não depreciar a imagem dos outros", ressalta Daiane afirmando que, apesar da filha já ter sofrido com o racismo na escola, não permitiu que a situação a afetasse emocionalmente.
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