Justiça reconhece validade de decreto expropriatório em favor de comunidade quilombola na Bahia
Advocacia-Geral da União (AGU) reverte sentença no Tribunal Regional Federal da 1ª Região e Incra pode seguir com regularização das terras
O Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) confirmou a validade do decreto de expropriação para interesse social em benefício da comunidade quilombola Olho d'Água do Basílio, localizada em Seabra, na região da Chapada Diamantina, na Bahia. Defendendo o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), a AGU reverteu decisão de primeira instância, de dezembro de 2024, que sustentava a extinção do processo de titulação das terras quilombolas. Com essa decisão, o Incra seguirá com a regularização e titulação das terras aos quilombolas.
O juiz federal havia defendido que o intervalo de oito anos entre o decreto presidencial, de 2012, que delimitou os 4.825 hectares a serem expropriados, e a ação de desapropriação do Incra, de 2020, estaria em desacordo com o prazo de dois anos estabelecido pela Lei 4.132/1962, que define os casos de desapropriação social por interesse social.
A AGU esclareceu, contudo, que a decisão feriu a Constituição Federal (CF), em especial o artigo 216, e o artigo 68 Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), que define que, "aos remanescentes das comunidades dos quilombos que estejam ocupando suas terras é reconhecida a propriedade definitiva, devendo o Estado emitir-lhes os títulos respectivos".
Nesse sentido, a AGU defendeu que "a desapropriação em questão não se fundamentaria em poder discricionário da Administração Pública ou constituiria sanção pelo cometimento de ato ilícito, mas consiste em poder-dever constitucionalmente imposto e exercitável a qualquer tempo, dada a atemporalidade da vigência dos precitados dispositivos do próprio texto constitucional".
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Um dos fundamentos apontados pela AGU foi o Decreto n° 4.887/2003, que regula o procedimento para identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação das terras ocupadas por remanescentes das comunidades de quilombos, que teve sua constitucionalidade afirmada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 3.239, de 2018. Tal decreto não prevê qualquer prazo para o ajuizamento da ação de desapropriação.
Conforme a Procuradoria Regional Federal da 1ª Região (PRF1), órgão da AGU responsável pela defesa do Incra no processo, também foi decisiva para a vitória no TRF1 a recente virada de jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) no julgamento do Recurso Especial 2.000.449-MT, de novembro de 2024. Alinhando-se ao entendimento do STF, o STJ definiu que a desapropriação para comunidades quilombolas tem caráter reparatório e de promoção de direitos fundamentais, de modo que não se aplicam os prazos de caducidade das desapropriações comuns.
Regularização fundiária
Formada por 73 famílias quilombolas no coração da Bahia, a comunidade Olho d'Água do Basílio foi certificada pela Fundação Cultural Palmares em 2005. Em 2009, foi concluído o Relatório Técnico de Identificação e Delimitação da Comunidade, que indicava a expropriação da propriedade Sítio Oliveira. O decreto presidencial que definiu a área como interesse social em favor do quilombo foi publicado em 2012.
O ajuizamento do Incra para efetivar a desapropriação ocorreu em 2020 e, em novembro de 2024, a comunidade foi incluída no Programa Nacional de Reforma Agrária (PNRA). No mês seguinte, o Tribunal de Justiça do Estado da Bahia (TJBA) declarou a caducidade do decreto expropriatório e extinção do processo, que foi logo contestada pela AGU.
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