Propaganda de aposta invade o campo e rouba a cena
Transmissão do Brasileirão mostra mais bets do que futebol
A temporada de 2025 escancarou o que já vinha se desenhando nas entrelinhas do futebol brasileiro: o jogo virou vitrine. Um levantamento minucioso da Folha revelou que em 70% do tempo de transmissão dos jogos do Campeonato Brasileiro aparece algum tipo de propaganda de casas de apostas — enquanto a bola rola de fato por apenas 55% desse tempo. Foram analisadas 22 partidas, somando 2.023 imagens congeladas ao acaso, num retrato inquietante de um futebol cada vez mais cercado por luzes de LED, slogans persuasivos e promessas de dinheiro fácil. Em duelos como Corinthians x Vasco e Sport x Palmeiras, a presença de apostas beirou os 80% das cenas.
Tecnicamente, a presença das bets afeta até o ritmo da narrativa esportiva. Os frames capturados revelam que o futebol, antes conduzido pelos pés dos atletas, agora é pautado pelo marketing agressivo. A exposição excessiva a esses estímulos visuais — como bem apontam estudos europeus — altera a percepção do torcedor, intensificando o apelo emocional da aposta. No calor do jogo, no "vamo que vamo" que se vê na tela, o torcedor é fisgado por odds reluzentes e chamadas que cruzam a linha tênue entre entretenimento e compulsão. E enquanto o VAR demora, o letreiro brilha.
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Na Bahia e em outros rincões onde o rádio ainda pulsa forte nos bares e esquinas, a discussão ganha eco. Se nos anos 90 a camisa do Bahia ostentava a Coca-Cola e o Vitória exibia bancos regionais, hoje as bets falam mais alto — e com mais cifrões. Nunca um só segmento monopolizou tanto espaço nas transmissões. Das camisas ao banner virtual, tudo virou moeda de troca. O impacto cultural é evidente: a velha mística da bola parece agora dividida com estatísticas de aposta, termos em inglês e aplicativos sedutores. O torcedor de outrora, que conhecia o time até pelo cheiro do vestiário, agora torce com o celular na mão e o saldo da conta em mente.
É claro que os clubes não vivem de vento — e num mercado sem política esportiva nacional, o dinheiro das bets virou salvação. Mas até quando? O projeto aprovado no Senado tenta pôr freio nesse avanço desenfreado, restringindo a exposição e blindando crianças e jovens. É medida sensata, mas tardia. O futebol brasileiro precisa urgentemente refletir se quer formar torcedores ou consumidores. Que a emoção do jogo volte a ser maior que o banner na tela. Porque se continuar assim, em vez de estádio, o torcedor vai acabar indo direto pro cassino virtual.
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